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Mercado de créditos de carbono vive um momento de expansão no Brasil, impulsionado por uma leva de novas plataformas digitais
27/10/2025 às 18:42 atualizado em 27/10/2025 às 18:54
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Mercado de créditos de carbono vive um momento de expansão no Brasil | Fernando Dantas/Unsplash
O mercado de créditos de carbono vive um momento de expansão no Brasil, impulsionado por uma leva de novas plataformas digitais que prometem facilitar o registro, a comercialização e a gestão desses ativos ambientais.
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De iniciativas de grandes players financeiros, como a B3, a projetos acadêmicos inovadores, como o da Universidade de São Paulo (USP), a variedade de opções sinaliza um amadurecimento do setor. No entanto, essa proliferação de soluções tecnológicas e comerciais parece caminhar em velocidade superior à resolução de problemas crônicos de credibilidade que há anos assombram o mercado, criando uma perigosa desconexão entre a forma e o fundo.
A reportagem do Jornal Nacional de 10 de outubro de 2025 ilustra bem o otimismo em torno da inovação. A notícia destacou a criação de uma plataforma pela USP para calcular e agilizar a compra e venda de créditos de carbono, com a promessa de um registro de menor custo e a potencialização do valor do crédito. A reportagem mostrou empresas documentando atividades de reciclagem para gerar créditos, um exemplo do ímpeto em tornar mensurável e comercializável a ação ambiental.
Essa iniciativa junta-se a um ecossistema já diverso. A plataforma da B3, lançada também em 2025 em parceria com a bolsa internacional ACX, oferece uma infraestrutura robusta para registro e comércio de créditos, com foco em transparência e integração global. A Carbon Fair, pioneira desde 2008, utiliza blockchain e defende créditos "socialmente justos". A Azul entrou no mercado com uma unidade de negócios de cunho consultivo, e o programa Carbon Free Brasil atua com um viés pragmático de neutralização de emissões.
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O Abismo da Credibilidade
Apesar do aparente avanço, um olhar crítico sobre os documentos que detalham o funcionamento dessas plataformas revela que a sofisticação tecnológica e a agilidade comercial não estão sendo acompanhadas pelo aprofundamento necessário em questões sociais e ambientais fundamentais. Os mesmos problemas que minam a credibilidade do mercado global de carbono persistem, quase intocados, pela narrativa de facilitação.
Dois desafios se destacam de forma crítica:
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Apesar do desenvolvimento e existência de metodologia - como o Naural Forest Standart (NFS) - que considera índices com maior relação a complexidade climática, ao equilíbrio ecológico e as potencialidades das populações e recursos tecnológicos existentes, muitas plataformas e iniciativas possuem desconexão com as barreiras de efetivação do importante mercado global de serviços ambientais.
Transparência para Quem?
A promessa de transparência, bandeira de várias plataformas – especialmente as que usam blockchain –, também esbarra em limitações. A complexidade das informações técnicas e a falta de padronização podem criar uma transparência opaca, acessível apenas a especialistas. Para o cidadão comum, para a comunidade impactada ou mesmo para pequenos investidores, fica difícil verificar se, por trás daquele crédito adquirido pela empresa para neutralizar suas emissões, há de fato um benefício socioambiental tangível e justo.
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Inovação a Serviço de Quê?
A criação da plataforma da USP, com sua proposta de baixo custo, é bem-vinda para democratizar o acesso. Contudo, se o foco for apenas baratear e acelerar o registro sem enfrentar os nós críticos do CLPI e da verificação contextualizada, a iniciativa poderá acabar por inflar um mercado de créditos de baixa confiabilidade.
A maturação do mercado de carbono brasileiro não será medida pelo número de plataformas ou pela velocidade das transações, mas pela sua capacidade de gerar créditos que sejam, de fato, efetivos, justos e socialmente responsáveis. As plataformas, como facilitadoras essenciais, têm a responsabilidade de ir além da mediação comercial.
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Elas precisam incorporar em seus núcleos mecanismos que garantam que o progresso tecnológico não seja mais uma camada de desconexão entre a economia verde e os direitos das populações que, no fi m das contas, são as guardiãs dos ativos ambientais que o mercado tenta precificar. A verdadeira inovação estará em conectar eficiência com credibilidade inquestionável.
Antônio José Fernandes é bacharel em química e tecnólogo em Mecatrônica Industrial, mestre de Química de Produtos Naturais e doutor em Físico-química. Atualmente é membro do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Amazônia (NEPAM/UFAM e diretor Técnico/Científico do Instituto Amazônia Livre (IAL)
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