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Cotidiano

Amazônia: muito além do estoque de carbono

Tratar a conservação da Amazônia apenas como forma de capitalizar recursos econômicos para projetos é uma falácia perigosa; texto por Rodrigo Lima

Da Reportagem

10/09/2025 às 18:51  atualizado em 10/09/2025 às 18:52

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Elevar a Amazônia à sua verdadeira importância significa exigir que o mundo reconheça e pague por todo esse conjunto

Elevar a Amazônia à sua verdadeira importância significa exigir que o mundo reconheça e pague por todo esse conjunto | Divulgação/Prefeitura de São José do Xingu

Por Rodrigo Lima 

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Enquanto a crise climática se intensifica e nos mostra do que é capaz, a discussão global sobre mecanismos de financiamento de conservação da maior Floresta Tropical do mundo frequentemente se reduz a uma métrica simplista: toneladas de carbono.

No entanto, a floresta com a maior biodiversidade do planeta não é um mero depósito de partículas de carbono. Tratar a conservação da Amazônia apenas como forma de capitalizar recursos econômicos para projetos é uma falácia perigosa que ignora sua complexidade e seu papel multifacetado e insubstituível na estabilidade do sistema Terra. 

A ciência é clara e robusta, baseada em décadas de pesquisas de instituições nacionais sérias como o INPE, o INPA, a UFAM entre outras. A Amazônia é uma bomba d'água continental. Através da evapotranspiração, suas árvores lançam bilhões de toneladas de vapor de água na atmosfera diariamente, alimentando os "rios voadores" que irrigam o Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil, bem como, em outros países sul-americanos.

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Além disso, bilhões de litros de água com nutrientes são lançados constantemente nas correntes oceânicas pela foz do Rio Amazonas, garantindo a produção de pescados na Noruega, por exemplo.

Este serviço é fundamental não somente para a segurança hídrica, geração de energia elétrica e produção agroindustrial que sustenta nosso PIB, como, também, para as economias mundiais. Sem a Amazônia funcionando plenamente, esse ciclo se rompe, com consequências econômicas e sociais catastróficas a nível global.

Sua biodiversidade, a maior do planeta, é outro pilar de importância ímpar. Cada hectare abriga um patrimônio genético inestimável, uma farmácia e uma biblioteca de soluções evolutivas ainda não decifradas. No Antropoceno (período atual), enfrentamos crises de saúde, alimentares e de recursos. A bioprospecção responsável nesta biblioteca viva é nossa melhor aposta para novas medicinas, biocombustíveis, alimentos e materiais que permitirão uma transição ecológica verdadeira. Queimar essa biblioteca é condenar nosso futuro potencial.

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Quem mantém este sistema funcionando contra todas as adversidades são os povos e comunidades tradicionais: indígenas, ribeirinhos e quilombolas. Inúmeras pesquisas demonstram que os territórios indígenas são as barreiras mais eficazes contra o desmatamento. Seu conhecimento tradicional, acumulado por milênios, é a chave para entendermos a dinâmica da floresta e para desenvolvermos modelos de uso sustentável que não a destrua. Eles não são meros guardiões; são parceiros indispensáveis na governança desse bem comum global.

É com base nessa premissa ampla que devemos discutir financiamento e mercado de carbono. Os serviços ecossistêmicos prestados pela Amazônia – a regulação climática, a manutenção dos rios voadores, a preservação da biodiversidade e a própria manutenção dos estoques de carbono – são a base para um novo pacto econômico.

O pagamento pela manutenção desses serviços não é esmola ou “ajuda” internacional; é um investimento estratégico na estabilidade do planeta e uma contrapartida justa pelo modelo de desenvolvimento que o Brasil escolher adotar: o da Floresta Viva. Esses recursos devem financiar a transição ecológica local, remunerando as comunidades com a geração de emprego e renda através dos serviços ambientais que monitoram e conservam, fomentando bioeconomias de alto valor e custeando a infraestrutura de proteção necessária.

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Nesta COP-30, o Brasil tem a oportunidade histórica de assumir uma liderança climática autêntica. Para isso, deve entrar no mercado global de carbono não como um vendedor de "partículas de carbono" ou “papéis de crédito”, mas como o provedor do serviço ambiental que garante os serviços ecossistêmicos mais complexos e críticos do mundo. O estoque de carbono da Amazônia é inseparável de sua biodiversidade, de seus rios voadores e da cultura de seus povos. Este é o pacote completo. Este é o ativo real.

Elevar a Amazônia à sua verdadeira importância significa exigir que o mundo reconheça e pague por todo esse conjunto. Significa construir uma economia do século XXI onde a preservação valha mais que a destruição baseada no lucro a qualquer custo. O futuro não será neutro em carbono apenas com Amazônia Viva, mas também não será possível, próspero, justo ou biologicamente diverso sem ela. É hora do mundo investir nessa verdade.

Rodrigo Lima é Gestor Ambiental, Mestre em Gestão de Áreas Protegidas na Amazônia pelo INPA, Especialista em metodologias e projetos de carbono, membro do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Amazônia (NEPAM/UFAM) e Conselheiro Presidente do Instituto Amazônia Livre (IAL).

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