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Cotidiano

O preço que São Paulo paga pela verticalização acelerada de seus bairros

Dezenas de prédios novos mudam a paisagem de bairros como Pompeia e Perdizes, mas o boom imobiliário esconde ameaças invisíveis para a vida da cidade

Julia Teixeira

06/10/2025 às 21:49

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Um dos efeitos mais problemáticos da expansão imobiliária é a impermeabilização do solo

Um dos efeitos mais problemáticos da expansão imobiliária é a impermeabilização do solo | Freepik

Quem mora ou trabalha em bairros paulistanos como Pompeia, Perdizes ou Vila Mariana tem testemunhado uma transformação acelerada: casas dão lugar a imponentes espigões e guindastes dominam a paisagem.

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Este intenso processo de verticalização é uma consequência direta do Plano Diretor de 2014, lei que buscou concentrar o crescimento da cidade em regiões com melhor infraestrutura, próximas ao transporte público, os chamados Eixos de Estruturação da Transformação Urbana (EETU).

No entanto, enquanto os prédios sobem rapidamente — alguns com até 37 andares e sem limite de altura —, especialistas alertam que a infraestrutura da cidade, concebida há décadas, pode não estar acompanhando este ritmo.

Os transtornos com o trânsito e o ruído das obras são apenas a ponta do iceberg. Sob o asfalto e na complexa rede urbana, escondem-se ameaças que exigem atenção urgente, especialmente com o avanço das mudanças climáticas.

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O boom imobiliário pode significar um aumento no risco de enchentes, sobrecarga nos sistemas de esgotamento sanitário e até mesmo a ameaça de novos apagões de energia em São Paulo.

O equilíbrio entre o interesse do mercado imobiliário e a manutenção da qualidade de vida na metrópole está em jogo. Afinal, a cidade consegue sustentar a nova e colossal demanda gerada por esses empreendimentos? O Jornal da Unesp chamou especialistas em urbanização para entender melhor esse fenômeno.

Infraestrutura elétrica: o dilema dos carros e do ar-condicionado

Com o aumento da densidade habitacional e o crescimento acelerado da frota de veículos elétricos, a demanda por eletricidade deve disparar. Como explica Pedro Luiz Côrtes, professor do Instituto de Energia e Ambiente da USP, "Num lugar onde havia seis casas, vai surgir um conjunto de cem apartamentos."

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Embora a geração e transmissão de energia no Brasil sejam robustas, o problema reside na distribuição dentro das cidades e na fragilidade da manutenção de emergência, como ficou evidente nos apagões após chuvas recentes.

O uso do carro elétrico agrava o cenário. Madson Cortes de Almeida, professor da Unicamp, compara a recarga noturna de um veículo em um condomínio com "deixar o chuveiro do meu apartamento ligado por várias horas durante a noite."

Em edifícios com dezenas de apartamentos, o impacto na rede é "muito importante". O desafio é grande, pois as redes de bairros antigos, como a Pompeia, têm cabeamento concebido há décadas. Mudar a rede elétrica "não é possível... do dia para a noite, é um processo lento", observa Almeida.

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Construtoras e moradores também precisam lidar com novas normas de segurança mais rígidas para garagens com tomadas de recarga, o que gera dúvidas sobre custos e viabilidade técnica.

Esgoto e saneamento: galerias subdimensionadas

O rápido surgimento de centenas ou milhares de novos domicílios em uma região também levanta um ponto de interrogação sobre o sistema de esgotamento sanitário. Apesar de São Paulo ter uma cobertura de coleta de 75,2% — bem acima da média nacional —, esse número não é totalmente real devido a vazamentos e ligações clandestinas.

O engenheiro Gustavo Ribeiro, professor da Unesp, alerta que, em um curto espaço de tempo, as galerias de esgoto podem ficar subdimensionadas. Isso ocorre porque o dimensionamento da rede é feito pensando em um horizonte de 20 a 30 anos.

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Quando o sistema trabalha "forçado" (com a tubulação cheia), a tendência é que o esgoto volte para as casas ou extravase nas bocas de lobo, especialmente em épocas de enchentes. A responsabilidade da construtora vai até a ligação com a rede pública, mas o ônus do subdimensionamento recai sobre o sistema municipal.

Para onde vai a água? O risco das enchentes

Um dos efeitos mais problemáticos da expansão imobiliária é a impermeabilização do solo. Com mais prédios e garagens profundas, menos água da chuva consegue penetrar no solo, e o volume escoa para as galerias pluviais já saturadas, aumentando o risco de enchentes. A situação é crítica em locais com histórico de alagamentos, como a Pompeia, onde há até um "enterrado vivo": o córrego da Água Preta.

O urbanista Arthur Cabral, da Unesp, explica que uma construção de grande porte próxima a nascentes pode mudar a localização dos olhos d'água ou até mesmo causar o seu dessecamento. Ele defende que soluções para enchentes devem incluir medidas não estruturais, como a criação de jardins drenantes e outras áreas permeáveis.

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Para especialistas como Ivan Maglio, pesquisador da USP, o Plano Diretor está na "contramão" da emergência climática ao não exigir que os empreendimentos mantenham áreas permeáveis. Ele considera os piscinões uma solução "ultrapassada e limitada", defendendo o investimento em soluções baseadas na natureza, como parques, para diminuir a velocidade da água.

O debate continua entre a necessidade de um Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) para cada Eixo de verticalização e a busca por taxas de permeabilidade mais rígidas que garantam um crescimento sustentável para a metrópole.

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