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Micarla Lins

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O Brasil não odeia mulheres em silêncio

Enquanto o ódio segue em voz alta, a nossa resposta precisa ser ainda mais clara e ainda mais alta

03/12/2025 às 03:00

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Quando uma mulher perde a voz, ela perde tudo; perde autonomia, clareza, percepção de risco e capacidade de pedir ajuda

Quando uma mulher perde a voz, ela perde tudo; perde autonomia, clareza, percepção de risco e capacidade de pedir ajuda | Freepik

Esta semana escancarou o que sempre esteve à nossa frente: a violência contra mulheres não começa no crime, mas no silenciamento cotidiano.

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E enquanto não entendermos isso, nada muda. O Brasil atravessou uma das semanas mais violentas do ano.

Em São Paulo, uma mulher foi atropelada e arrastada pelo ex-namorado até perder as pernas. Em Minas Gerais, duas profissionais foram assassinadas no ambiente de trabalho por um servidor público que não aceitava a liderança feminina.

Já no Rio de Janeiro, o influenciador Thiago Schutz foi preso em flagrante por violência doméstica. O mais chocante não foi apenas o crime, mas os comentários responsabilizando a vítima por “ter escolhido mal”, como se a responsabilidade de não apanhar fosse dela.

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Esses episódios não são exceções isoladas; são expressões de um padrão nacional. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, uma mulher é assassinada a cada 6 horas no Brasil. A cada 2 minutos, uma mulher sofre violência doméstica.

Em 70% dos feminicídios, o agressor é parceiro ou ex-parceiro. E em 78% dos casos fatais, a vítima já havia relatado medo, ameaças ou agressões antes de morrer.

Nesta mesma semana, a jornalista da Globo Duda Dalponte teve o cabelo puxado durante uma entrevista ao vivo. Uma agressão pública, visível, registrada por câmeras. Ainda assim, muitos trataram como brincadeira. É exatamente assim que o ciclo se estabelece: quando pequenas agressões são minimizadas, o desrespeito vira ambiente, e o ambiente permite que a violência escale até níveis irreversíveis.

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A pergunta que deveríamos fazer não é por que esses crimes acontecem, mas por que continuamos tratando os sinais como exagero feminino. E aqui entra algo que não digo como colunista, mas como mulher que já viveu o apagamento emocional.

Quando uma mulher perde a voz, ela perde tudo. Perde autonomia, clareza, percepção de risco, capacidade de pedir ajuda. O silêncio imposto destrói antes do primeiro golpe.

Esse não é apenas meu relato, é dado. Setenta por cento das mulheres que sofrem violência doméstica afirmam que o primeiro sintoma do abuso não foi físico, mas emocional. Foi a sensação de não poder falar, de ser desacreditada, de ter sua narrativa diluída.

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Pesquisas internacionais mostram que dinâmicas de poder construídas pela comunicação, como interrupção constante, deslegitimação, humilhação e controle narrativo, antecedem a violência física em mais de 80% dos casos. Antes de um agressor encostar no corpo da vítima, ele já encostou na mente dela. Já minou sua autoconfiança, isolou seus apoios, distorceu sua percepção da realidade, implantou culpa e confusão.

Psicologia 

A psicologia chama isso de violência simbólica. A comunicação chama de apagamento. Para as mulheres, isso é simplesmente o início do medo.

Por isso, a resposta não está apenas em leis mais duras ou em protocolos de segurança. Esses elementos são fundamentais, mas chegam tarde demais para quem já foi silenciada por dentro. A transformação começa muito antes, na reconstrução da voz das mulheres. Quando uma mulher fala, algo se reorganiza. Quando ela nomeia o que vive, algo volta ao lugar.

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Quando ela recupera a própria narrativa, ela começa a recuperar a própria vida.

A violência se sustenta pelo silêncio. A ruptura começa pela voz. Não se trata de responsabilizar mulheres, mas de devolver poder. Falar não resolve tudo, mas calar nunca resolveu nada. Falar é o início dos limites, da proteção, do reconhecimento de perigo, da tomada de consciência. É o primeiro passo real para interromper ciclos que a sociedade insiste em naturalizar.

Depois da semana mais brutal do ano, termino com o que considero fundamental. Não é o dado, nem a manchete, nem a comoção do momento. É o convite.

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Solte a sua voz. Conte a sua história. Seja ouvida antes que seja tarde. A sua voz é o primeiro território que ninguém mais tem o direito de tomar.

Enquanto o ódio segue em voz alta, a nossa resposta precisa ser ainda mais clara e ainda mais alta.

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