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Cotidiano
Milhares de estudantes brasileiros que foram à faculdade na intenção de conquistar melhores oportunidades no mercado de trabalho estão com dívidas no financiamento
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Ex-estudantes acumulam dívida do financiamento estudantil. | MARCELLO CASAL JR/AGÊNCIA BRASIL
A busca da auxiliar administrativa Evenise Castro, 28, pelo diploma de ensino superior terminou em frustração e com uma dívida de R$ 67 mil. Moradora de Pelotas, no Rio Grande do Sul, ela financiou o curso de direito em uma instituição privada na esperança de uma promoção na empresa.
Faltando pouco mais de um ano para concluir a faculdade, ela teve o contrato do Fies (Financiamento Estudantil) cancelado por um problema no processo de renovação obrigatório. Ela até tentou continuar o curso no módulo particular, mas teve que abrir mão do diploma quando o preço da mensalidade pesou demais. "Aumentou R$ 500 de um semestre para o outro e não consegui manter".
Passado os 18 meses de carência até a amortização do contrato do financiamento começar, ela ainda não tinha se reestabelecido financeiramente. Sem diploma e sem conseguir arcar com as parcelas do financiamento, ficou inadimplente.
Assim como ela, milhares de estudantes brasileiros que foram à faculdade na intenção de conquistar melhores oportunidades no mercado de trabalho estão com dívidas no financiamento. Segundo o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), 1.093.053 contratos do Fies estão com atraso no pagamento das parcelas.
Para diminuir o número de inadimplentes, o governo federal lançou uma campanha de renegociação que oferece abatimento de até 99% na dívida. O acordo pode ser feito na Caixa Econômica Federal ou no Banco do Brasil.
Podem solicitar a renegociação estudantes que contrataram o financiamento até o segundo semestre de 2017 e que possuem parcelas em atraso acima de 90 dias em 30 de dezembro de 2021. De acordo com o FNDE, atualmente 891.355 contratos se enquadram nessas condições.
Ainda segundo o FNDE, 780.487 estudantes estão em dia com a mensalidade. Esse grupo também pode participar da negociação para quitar o saldo devedor, em parcela única, com desconto de 12% sobre o valor restante do contrato.
A expectativa de negociar a dívida e limpar o nome animou Evenise até o momento de fazer as simulações. As condições disponíveis eram de pagar 15 parcelas de R$ 1.029,19 ou em até 150 vezes de R$ 728,37. Nos dois casos, a cobrança sofre reajuste mensal da Selic.
"Estava na esperança de negociar agora, pois preciso do meu nome limpo. Mas o valor ficou totalmente inviável. Eu preciso escolher se termino o curso, pago o Fies ou fico com dinheiro para viver".
Formado em fisioterapia em 2018, Pedro Paulo do Nascimento, 29, aguardava o período de negociação para tentar quitar o contrato de quase 15 anos que tem com o Fies. Desde que o período de amortização começou em 2020, ele tem conseguido manter os pagamentos em dia.
"Aos trancos e barrancos eu consigo pagar. Não posso atrasar porque se não quem sofre as consequências é meu fiador".
Natural de Mossoró, no Rio Grande do Norte, Nascimento se mudou para Rosário, na Argentina, onde cursa a faculdade de medicina. A quitação do contrato aliviaria bastante as despesas, já que o Fies consome quase metade do custo de vida dele na Argentina.
Por estar em dia com o financiamento, a única proposta disponível seria quitar a dívida à vista com desconto de 12%.
"Achei um absurdo. De onde um estudante recém-formado vai tirar R$ 70 mil para um pagamento à vista".
Quando recorreu ao Fies para cursar psicologia em 2012, Cínthia Pereira da Silva, 30, achou que já estaria estabilizada na área quando as parcelas do financiamento começassem a vencer.
Mas quando conseguiu o diploma em 2016, percebeu que as coisas não seriam bem do jeito que ela imaginou. "O mercado de trabalho é muito concorrido e só a graduação não era suficiente para conseguir uma vaga".
Moradora de São José do Rio Preto, São Paulo, Cínthia conseguiu manter o pagamento até 2020, mas depois precisou abrir mão das parcelas para ir em busca de especialização. Sem conseguir conciliar os gastos, ela viu a dívida se transformar em uma bola de neve.
No início deste ano, quando o governo abriu prazo de renegociação do Fies ela conseguiu um acordo para pagar a dívida em dez vezes e com um desconto de 86% no valor total. "Foi muito tempo de sufoco, mas agora está sendo um alívio porque meu nome já não está mais negativado".
RENEGOCIAÇÃO DÁ DESCONTO DE ATÉ 99%
Paula Rodrigues Ferreira, 26, tinha acabado de concluir o ensino médio quando decidiu ingressar na faculdade de direito em uma instituição particular em 2014. Mesmo sem ter certeza se era o que queria, ela recorreu ao financiamento estudantil.
"Foi meio por impulso. Fazia estágio em uma empresa que dava oportunidade de trabalho para quem estava na faculdade e decidi entrar".
No segundo ano da graduação, moradora de Rolândia, no Paraná, ela se deu conta de que não era o que queria e trancou a matrícula. Na mesma época, perdeu o emprego e mudou de cidade.
Quando a fase de amortização do contratou terminou, já não tinha condições de pagar a conta. "Fiquei desesperada. Eu não tinha nem coragem de ir atrás. Tinha medo só de saber quanto estava devendo".
Foram cinco anos tentando ignorar a dívida, até que Paula decidiu parar de fugir da situação. Ela entrou em um grupo nas redes sociais que reúne estudantes interessados em compartilhar histórias e tirar dúvidas sobre o Fies. Foi quando soube da abertura do período de renegociação.
"Precisei ir no banco porque não tinha mais acesso ao aplicativo". A dívida total estava em R$ 14,8 mil. Até que veio a surpresa, por estar registrada no CadÚnico e ter recebido Auxílio Emergencial em 2021, ela estava habilitada a receber desconto de 99% no pagamento à vista.
O valor para quitar o débito caiu para R$ 149. "Paguei na mesma hora, porque tive medo de eles tirarem a proposta". "Fiquei muito aliviada, porque tirei um grande peso das costas. Mas se fosse cursar faculdade de novo, não faria financiamento".
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