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No Brasil, os motociclistas já são as principais vítimas dos sinistros de trânsito | Rodrigo Pivas/Gazeta de S.Paulo
As mortes de motociclistas nas ruas e estradas brasileiras não param de crescer. Só em 2023, 13.521 motociclistas morreram no Brasil, representando 38,8% de todas as vítimas do trânsito. O número é um salto de 25,4% em relação aos dados de 2010, quando morreram 10.153.
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A motocicleta, antes alternativa de mobilidade acessível, agora ocupa o centro de uma crise pública que exige ação imediata.
Em São Paulo, o debate sobre como salvar vidas passou a confrontar entre a educação e a punição. A resposta, segundo especialistas, não está na divisão, mas na combinação estratégica de infraestrutura segura, gestão pública eficiente e campanhas educativas baseadas em evidências.
Durante evento realizado nesta quarta-feira (23/7) pelo Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo (Detran-SP), com apoio da Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran), o coordenador nacional do Programa de Segurança Viária da Vital Strategies, Dante Rosado, foi categórico:
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“Falar sobre trânsito é tratar de saúde pública. Não podemos colocar esse problema debaixo do tapete. Morreram 95 pessoas por dia no trânsito em 2023, é como se vivêssemos um desastre da Chapecoense diariamente.”, disse Rosado.
No Brasil, os motociclistas já são as principais vítimas das mortes de trânsito, com um número crescente de mortes impulsionado pelo aumento da frota, atualmente, esse número é superior a 35 milhões de motocicletas, cerca de um terço de todos os veículos do País.
Na última quinta-feira (19/6), um motociclista morreu após se envolver em um acidente com dois carros, na rodovia Ayrton Senna (SP-070), no sentido de São Paulo.
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Se nada mudar, as mortes de motociclistas podem ultrapassar 14 mil por ano, alerta Rosado. E quem mais sofre são homens jovens, negros e pobres. Em 2021, 65% das fatalidades no trânsito eram negras, com predominância entre os 20 e 39 anos.
Para o coordenador executivo da iniciativa Bloomberg em São Paulo, Diogo Lemos, a infraestrutura urbana brasileira é parte fundamental do problema.
“Não estamos preparados. Nossas cidades foram pensadas para os carros. Falta infraestrutura básica para pedestres e motociclistas. Largura das faixas, cruzamentos, semáforos e medidas de moderação de tráfego praticamente não existem ou estão presentes de forma muito pontual.”
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Ele menciona que Fortaleza conseguiu reduzir pela metade o número de mortes no trânsito ao investir em infraestrutura voltada para usuários vulneráveis e redução dos limites de velocidade, tudo isso somado as ações de comunicação direta com a população.
“Não foi por acaso. Foi uma transformação com estratégia, diálogo e foco. Em São Paulo, temos um fundo de multas que pode e deve ser usado para segurança viária. Esse dinheiro pode financiar infraestrutura, fiscalização inteligente e ações baseadas em dados, priorizando os locais mais perigosos”, diz.
A discussão sobre segurança viária também passa pelas motofaixas, as faixas exclusivas para motos implantadas em avenidas movimentadas de São Paulo. Para a coordenadora de mobilidade da Bloomberg, Rafaella Basile, a medida continua em fase de testes e precisa ser avaliada com cautela:
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“É um modelo de sinalização que ainda está sendo testado. A gente não sabe se essas faixas vão de fato aumentar a segurança para os motociclistas ou gerar novos riscos para pedestres e motoristas.”
No início deste mês, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) entregou 11,5 quilômetros de Faixa Azul na zona leste de São Paulo. Assim, a cidade está com 232,7 quilômetros de faixas preferenciais para motociclistas.
Rafaella explica que a redução da largura das faixas de rolamento, prática associada à instalação das motofaixas, é uma medida eficaz para reduzir a velocidade praticada, o que ajuda a evitar os sinistros.
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“Toda vez que você reduz a largura da faixa, cria uma percepção ótica no motorista de que precisa ir mais devagar. Isso melhora o tempo de reação e a frenagem. Mas a gente ainda precisa entender se a motofaixa pode gerar outros efeitos colaterais, como aumento da velocidade dos próprios motociclistas ou mais atropelamentos, especialmente em cruzamentos.”
Ela também cita uma experiência anterior na avenida Sumaré, em São Paulo, onde o número de atropelamentos aumentou 600% após a implantação de uma motofaixa ao lado do canteiro central.
“É preciso avaliar se essa nova configuração não está gerando mais riscos do que soluções. Existe uma falsa sensação de segurança para o motociclista, que pode ignorar a faixa de pedestre, por exemplo. E quando a moto está entre dois carros, o pedestre muitas vezes não a vê chegando — e o risco de atropelamento aumenta.”
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Rafaella destaca que há um guia técnico com diversas soluções urbanas comprovadas, disponível para gestores públicos.
O “Guia de Medidas de Moderação de Tráfego” traz intervenções como lombadas (deflexão vertical), chicanes e estreitamentos de via (deflexão horizontal), que reduzem a velocidade e aumentam a segurança para todos os usuários — inclusive motociclistas.
“Temos uma lista de medidas que podem e devem ser aplicadas. Muitas cidades no mundo usam essas soluções com sucesso. O que falta aqui é escala, vontade política e investimento direcionado”, resume Rafaella.
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Diante da crise de segurança viária, os especialistas concordam que não há solução única. É preciso educar, fiscalizar e transformar o ambiente urbano. Os dados já existem, os exemplos estão dados, o que falta é decisão política.
“Salvar vidas no trânsito precisa ser compromisso de governo. Todo gestor deveria entrar no cargo já pensando: como vou proteger quem circula nas ruas da minha cidade?”, finaliza Diogo Lemos.
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