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Documentos indicam atuação com irregularidades da Voepass em Cascavel; entenda

Companhia aérea atuou sem contrato entre março e junho no aeroporto regional da cidade; autarquia responsável formou comissão para apuração

Crisley Santana

27/09/2024 às 17:37  atualizado em 27/09/2024 às 17:39

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Aeronave modelo ATR-72-500 da Voepass

Aeronave modelo ATR-72-500 da Voepass | Reprodução

Há um mês, em 26 de agosto, uma suposta denúncia anônima teria sido encaminhada ao Ministério Público do Paraná, acusando a empresa aérea Voepass de operar irregularmente no município de Cascavel. A informação foi publicada pelo Congresso em Foco na data.

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A denúncia, de acordo com a matéria, alega suposto crime de responsabilidade por parte da autarquia municipal Transitar, responsável por regular o setor de mobilidade na região

Os documentos que indicam as irregularidades foram obtidos pela Gazeta. A empresa teria usado as áreas do Aeroporto Municipal Coronel Adalberto Mendes da Silva do dia 31 de março a 18 de junho sem contrato administrativo que a autorizasse. 

Em resposta à reportagem, o prefeito da cidade Leonaldo Paranhos (PL), negou que tenha havido irregularidades, pois de acordo com ele o fato representa apenas uma questão administrativa contratual, corriqueira na gestão municipal e já resolvida. Leia mais abaixo. 

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Histórico 

Os documentos a que a Gazeta teve acesso dão conta de um histórico que inicia em 14 de fevereiro de 2024, quando a Transitar deu início a abertura de um processo licitatório para liberar áreas do aeroporto para serviços de check-in e check-out e manutenção de aeronaves pela Voepass.

O documento informa que a permissão do uso das áreas seria concedida “a título precário, qualificado e oneroso” e solicita “caráter prioritário”, pois a Voepass teria pretensão de iniciar as atividades até o dia 30 de março. 

Em 22 de fevereiro, a área jurídica da empresa emite um relatório no qual entende ser “cabível a dispensa de licitação ou processo licitatório que garanta competitividade” para uso das áreas do aeroporto pela Voepass.

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“A dispensa por justificativa se dará com base no Art. 3°, inciso |l, da lei 14.133/2021 — Nova Lei de Licitagdes, no Art. 40 da Lei 7.565/1986 — Código Brasileiro de Aeronautica, e com base também no Art. 75 da lei 14.133/2021”, indica um comunicado interno ao solicitar um Termo de Permissão de Uso.

Em 5 de março, a portaria administrativa de número 032/2024, assinada pela presidente da autarquia, Simoni Soares, designa os servidores responsáveis por gerir e fiscalizar os contratos. As atribuições estão previstas no Decreto Municipal nº 2 14.405 de 11 de setembro de 2018. 

Em 11 de março, é assinado pelas partes (Transitar e Voepass) um Termo de Permissão Direta de Uso de Espaço Público. O documento estabelece as condições para a contratação, por exemplo, entre outras questões. 

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No mesmo dia, a empresa emite uma declaração de responsabilidade pela pesquisa de mercado. O levantamento indica valores de referência para concessão do uso do espaço público pela companhia aérea.

Em 25 de março, a Transitar encaminha para análise jurídica processo para conceder dispensa de licitação e efetivar a autorização de uso das áreas do aeroporto para a Voepass.

Dois dias depois, em 27 de março, o departamento jurídico analisa como legal a dispensa de licitação solicitada pela autarquia.

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Termo de Ajuste de Conduta sem validade

No dia 1º de abril, uma minuta do Termo de Ajuste de Conduta (TAC) foi anexada sem a devida assinatura das partes. O TAC serviria para regularizar o processo de concessão de uso das áreas.

Além de estar sem assinatura, por isso, sem validade legal, o TAC em questão não registra a data de celebração. Apenas indica o ano de 2023, sem maiores especificações.

Documento estava sem assinatura e sem dataDocumento estava sem assinatura e sem data / Gazeta de S.Paulo

No dia 2, é emitido um termo de apensamento que incorpora um processo de antecipação de tutela da então Passaredo (que passou por recuperação judicial) em face da Infraero (Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária). 

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O departamento administrativo e financeiro encaminha a minuta do TAC para análise e parecer jurídico na mesma data. O documento solicita também que o departamento forneça esclarecimentos sobre a possibilidade de dispensa de apresentação de certidões relacionadas à recuperação judicial pela qual a Voepass passou.

Em 8 de abril, o departamento jurídico entrega o parecer sobre o TAC. O relatório destaca que formalizar a obrigação de adequação da documentação solicitada pela Transitar a Voepass,”não substitui a necessidade de que esta documentação encontre-se regular antes da celebração da avença”. 

O relatório também indica que “no processo em apenso não foi juntada a decisão de deferimento do processamento da recuperação judicial ou o plano homologado (sobre a recuperação judicial da Voepass)”. 

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Parecer jurídico Transitar Parecer jurídico Transitar / Gazeta de S.Paulo

O departamento, então, recomenda que a administração da Transitar junte tais documentos a fim de verificar se consta “expressamente a dispensa da apresentação das referidas certidões”.  

Autorização e processo de apuração

Em 3 de maio, a Transitar solicita autorização para contratação direta da empresa de serviço aéreo. A solicitação é aceita e assinada pela presidente da autarquia. 

Autorização foi concedida junto a pedido de abertura de processoAutorização foi concedida junto a pedido de abertura de processo / Gazeta de S.Paulo

Ao fim da autorização, entretanto, ela determina que seja aberto um processo de apuração de responsabilidade devido ao início do serviço prestado pela companhia aérea sem contrato vigente. 

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Termo de Ajuste de Conduta válido

Somente em 5 de junho, as empresas firmaram um TAC válido, devidamente assinado pelas partes e com registro da data de celebração.

Termo foi devidamente assinado em 5 de junhoTermo foi devidamente assinado em 5 de junho / Gazeta de S. Paulo

Termo de permissão com data rasurada

O Termo de Permissão de Uso foi assinado em 18 de junho, conforme publicação em diário oficial. A denúncia que teria sido apresentada ao Ministério Público, entretanto, aponta para uma rasura no local de registro da data.

Um dos documento foi rasuradoUm dos documento foi rasurado / Gazeta de S.Paulo

De acordo com a acusação ainda, uma das assinaturas foi feita antes mesmo de sua existência, em 14 de junho.

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Cadastro no sistema do TRE

Em 25 de junho, o setor de contratos da autarquia emite uma “folha de informações”, indicando que a vigência do contrato entre Transitar e Voepass é de 31 de março de 2024 a 30 de março de 2025, ou seja, 12 meses, “podendo ser prorrogado em consonância com a legislação vigente”.

Folha de informações emitida em 25 de junhoFolha de informações emitida em 25 de junho / Gazeta de S.Paulo

A folha acrescenta que no sistema consta início da vigência em 18 de junho “visto que, foi quando se deu a conclusão do processo” e que não seria mais possível cadastrar para o início do mês de março porque a informação já havia sido enviada para o Sistema de Informação Municipal, Acompanhamento Mensal (SIM-AM) da cidade, vinculado Tribunal de Contas do Estado (TRE) do Paraná.

Comissão de Apuração Sumária

Pelo menos desde o dia 5 de setembro, a autarquia apura a atuação da Voepass no aeroporto regional da cidade entre os meses de março e junho sem termo de contrato ou permissão de uso.

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Na data, a presidente da empresa assinou portaria administrativa para alterar a designação de um suplente para compor uma Comissão de Apuração Sumária para analisar o caso.

Portaria administrativa assinada em 5 de setembro Portaria administrativa assinada em 5 de setembro / Gazeta de S.Paulo

“Os fatos a serem apurados se devem a atuação da empresa Passaredo Transportes Aéreos S.A (Voepass), destinada exclusivamente à atividade de exploração dos serviços de Transporte Aéreo Regular no Aeroporto Regional do Oeste - Coronal Adalberto Mendes da Silva, pelo período de de 31/03/2024 a 17/06/2024 SEM TERMO DE CONTRATO e/ou TERMO DE PERMISSÃO DE USO”, descreve o segundo artigo da portaria.

Crimes contra a administração pública

As supostas irregularidades apontadas pela denúncia por meio da documentação indicam que os funcionários da Transitar podem ter incorrido em crimes contra a administração pública. 

“São delitos que atentam contra o funcionamento adequado e a integridade das instituições públicas, seus agentes e os interesses da coletividade”, explicou o advogado criminalista Leonardo Watermann.

As possíveis irregularidades cometidas pela autarquia, podem incorrer em, por exemplo, prevaricação. “Quando o funcionário público retarda ou deixa de praticar ato de ofício, ou o pratica contra disposição expressa de lei, por interesse pessoal”, explicou Watermann.
A pena para este crime é de detenção de três meses a um ano, além de multa.

Por outro lado, as supostas irregularidades também apontam para crimes como corrupção e até falsidade ideológica, caso se confirme a alteração da data do Termo de Uso. Em se tratando de funcionários públicos, a situação pode ser ainda mais grave, de acordo com o advogado.

“A falsidade ideológica em documento público, quando cometida por um agente no exercício de suas funções, além de afetar a fé pública, pode caracterizar outros delitos ou agravar a pena”, disse Watermann.

A pena para falsidade ideológica é de reclusão de 1 a 5 anos para documento público, mas pode ser aumentada para um sexto se o autor for funcionário público e se valer do cargo para praticar o ato.

Outro lado 

Em resposta à reportagem da Gazeta, o prefeito de Cascavel, Leonaldo Paranhos (PL), disse que a possível irregularidade não tem nenhuma relação com o acidente aéreo envolvendo a empresa.

A aeronave ATR-72 da Voepass, antiga Passaredo, caiu no dia 9 de agosto no bairro Capela, em Vinhedo, interior de São Paulo. A aeronave saiu de Cascavel, no Paraná, com 58 passageiros e 4 tripulantes. Tinha como destino o aeroporto de Guarulhos, na Grande São Paulo. Não houve sobreviventes.

Paranhos afirmou que a Agência Nacional de Avaiação Civil (Anac) é o único órgão responsável pela atuação das empresas aéreas e que a suposta denúncia teria objetivos políticos. 

A presidente da Transitar, Simoni Mendes, respondeu com uma nota oficial publicada pelo Ministério Público do Estado. De acordo com o texto, a autarquia foi notificada e respondeu em 2 de setembro que as pendências contratuais foram sanadas. Leia no fim do texto. 

A Voepass, por sua vez, afirmou que a denúncia não procede e que a empresa não foi notificada pelo Ministério Público. Conheça a Voepass.

Nota do Ministério Público do Paraná 

A 12ª Promotoria de Justiça de Cascavel, com atribuição na defesa do consumidor, que instaurou procedimento para apurar o atendimento aos familiares das vítimas do voo 2283 da Voe Pass, informa que não recebeu qualquer denúncia por meio dos canais institucionais sobre a falta de autorização para operação da empresa em Cascavel. A despeito disso, tendo recebido notícia pela imprensa, oficiou a Transitar, autarquia que administra o aeroporto municipal, para solicitar esclarecimentos. Tendo recebido a resposta no dia 2 de setembro, concluiu da análise dessa resposta e dos documentos que a instruem que não existiu nenhuma falta de autorização para operar que pudesse indicar risco potencial ao consumidor. A empresa sempre esteve regular junto à Anac e a demais órgãos federais responsáveis. A autarquia indicou um período de suposta irregularidade contratual entre a ela e a empresa, que foi apurada administrativamente e sanada antes mesmo da ocorrência do acidente. A 12ª Promotoria de Justiça ressalta que essa questão contratual não tem nenhuma repercussão nos interesses coletivos dos consumidores afetados pelo acidente.

Nota da Voepass 

A suposta denúncia não procede. A VOEPASS Linhas aéreas reforça que todas as suas operações são regulares e ressalta ainda que não recebeu nenhuma notificação do Ministério Público do Paraná.

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